Quem é empreendedor sabe que a busca por investidores é necessária em algum momento do negócio. Mas, também pode imaginar que este seja um grande desafio, especialmente no início da jornada empreendedora. Isso porque, não possuir uma estratégia assertiva de fundraising pode representar um grande risco para o crescimento e até mesmo para o fracasso da empresa. O termo inglês, que ao pé da letra se traduz como levantamento (raise) de fundos (fund), ou seja, a captação de recursos para financiamento ou desenvolvimento de um projeto ou startup, é também um dos pontos que deve estar no centro das atenções do dono do negócio.
Esse é o alerta da contadora, especialista em finanças e CEO da startup Boli, Cínthia Liduário. Com ampla experiência na área de planejamento estratégico de empresas, Cínthia já atuou tanto na captação de recursos, como também esteve do outro lado da mesa, analisando negócios que buscavam investimento, quando era controller do grupo Movile, empresa investidora em startups como iFood, MovilePay, Zoop, Afterverse, Sympla e PlayKids. A experiência acumulada, ela aplica, atualmente, em sua própria startup, uma plataforma focada no mercado da dança.
“Nem sempre é necessário captar dinheiro, mas, para a maioria das empresas de tecnologia, é super necessário e significa fortalecimento do negócio e, principalmente, crescimento acelerado. Planejar uma captação eficiente pode ajudar a manter o foco no negócio e não na escassez de recursos. Nos primeiros passos das startups pode não ser necessário dividir o investimento financeiro, mas encontrar um sócio, ou sócios estratégicos, ao longo da jornada, pode ser decisivo e essencial para o negócio”. Cínthia Liduário, contadora, especialista em finanças e CEO da startup Boli.
A especialista fala da experiência pessoal como exemplo: “Após longas e diversas conversas com investidores e executivos, investi sozinha nos 12 primeiros meses e construí um planejamento para distribuir 20% para terceiros, no 2º ano de vida da startup. Isso não é regra do jogo. É resultado de muita análise, planejamento e experiência do próprio modelo de gestão”, afirma.
Segundo Cínthia, buscar um investimento é uma medida que visa à saúde da empresa, tanto financeira, quanto estratégica. “O dinheiro nunca vem sozinho. Ele pode vir acompanhado de parcerias estratégicas, expertises, opiniões, bons direcionamentos, etc. Mas, também pode trazer cobranças desnecessárias, pressões sem propósitos claros, desalinhamentos de negócio, entre outros pontos. Por isso, é importante investir tempo para descobrir qual tipo de investimento, o perfil do investidor e o momento para se buscar o investimento”, diz.
O MOMENTO IDEAL
Mas qual é a hora certa para fazer a captação? Muitos empreendedores têm dúvida se essa negociação deve ocorrer no início da jornada, ou posteriormente, em um momento de seed, de pré-seed ou de uma série A. Segundo Cínthia, “a pauta já estará presente desde o momento zero da empresa, naquelas primeiras perguntas que o idealizador se faz: O que quero com esse novo negócio? Onde ele vai chegar? Qual é o propósito dele? O que vou construir? O que vou impactar? Se você sabe o que quer e onde quer chegar, comece a desenhar o caminho, o famoso ‘como fazer’. E aí entra a pauta investimentos”, explica.
As perguntas acima virão em diversos momentos e ao analisar a evolução das respostas, a recomendação é que o empreendedor esteja sempre atento a planejar e a se relacionar. O networking é fundamental na jornada empreendedora. “Conte sua ideia, colha percepções e demonstre sua paixão. Seus futuros investidores podem estar do seu lado hoje”, cita Cínthia. E completa: “É preciso conquistar seus investidores e ser conquistado. É mais do que só apresentar seu negócio e esperar interesse/feedback. É encantar! Uma ideia, por melhor que seja, se sozinha, não faz um negócio dar certo e alcançar sucesso. Mas, a execução define o jogo”, diz.
Outro fator a ser considerado, na avaliação da especialista, é o tempo, uma vez que venture capital, geralmente, não chega de forma rápida, fácil e sem esforço. “É um privilégio quando o empreendedor já conhece aquele alguém que se encanta, confia e topa investir logo de cara. Por isso, se você não tem esse privilégio, comece a construir hoje a rede de prováveis investidores que estarão contigo amanhã”, recomenda.
E, para além da escolha do momento ideal, a maior recomendação é sempre que o fundraising ocorra mantendo a saúde financeira e estratégica da empresa. “A captação está diretamente relacionada à estratégia do negócio. As principais definições, como qual montante captar, qual o valor da empresa ou por quanto tempo o investimento vai durar, virão após muita análise e planejamento. Por isso, se confiante dos objetivos e muito atento ao planejamento constante, o empreendedor conseguirá levar seu negócio de forma saudável, fazê-lo crescer e ser aceito pelo mercado. E saberá responder às perguntas acima, ao longo do tempo. O recurso externo chegará para acelerar crescimento e não para garantir sobrevivência. Não espere que coloquem preço no seu negócio, construa o valor do seu negócio”, afirma.
TIME ENGAJADO
E claro, para que a captação de recursos seja um grande sucesso, todo o processo dependerá de pessoas. “Paixão, clareza de propósito, garra, foco, vontade de aprender, coragem, dentre outras características, são pontos avaliados pelos investidores em relação a quem lidera o novo negócio. Quando sozinho, o empreendedor pode ficar limitado a construir algo grande. Por isso, formar um time que compartilhe a mesma cultura e mantenha alinhamento estratégico, será crucial para todo processo de fundraising”, alerta.
“Este é um trabalho multidisciplinar e expertises diferentes precisam ser aliadas. Um time financeiro forte vai fazer diferença. O jurídico oferece agilidade e segurança. Além de marketing, comercial e tecnologia contribuírem para o antes, durante e depois do planejamento. Todas as áreas da empresa precisam se alinhar, de modo a garantir boa gestão, para que os recursos que vão chegar gerem ótimos resultados”. Cínthia Liduário, contadora, especialista em finanças e CEO da startup Boli.
Ela lembra que todas as ponderações são importantes para não haver ‘pontas soltas’ na negociação e ressalta que, se os fundadores não têm as expertises necessárias, como em finanças, a busca de apoio é fundamental. Consultores, coachings, conselheiros, ou pessoas próximas podem e deve ser convidadas para contribuir em toda a jornada, desde a construção de um bom pitch, até o momento vitorioso do dinheiro na conta.
Já em relação ao quanto se deve pedir para atingir o objetivo de crescimento da empresa, Cínthia explica que é justamente essa junção das demandas de cada área que vai revelar o valor. “Novamente, é importante haver um planejamento bem feito, para acertar a mão! Dificilmente a conta será 100% assertiva, mas quanto menor a margem de erro, mais vantagens para quem está vendendo. Tente não pedir nem para mais e nem para menos. Esteja confortável com os planos e assegure-se de avaliar seu negócio de acordo com a saúde financeira daquele momento”, recomenda.
Ainda em relação aos trâmites, ela explique que o processo burocrático do fundraising, após o famoso aperto de mãos, pode não ser tão rápido (principalmente quando envolve times grandes, cifras relevantes, advogados externos, etc). “O prazo de negociação depende de muitos fatores, podendo ocorrer em semanas ou se delongar por meses. Por isso, inclua essa previsão no seu planejamento de captação. Não seja o empreendedor que vive em função de investidores, buscando constantemente novos aportes. Planeje bem, execute bem e tenha tempo para o negócio”, diz.
Segundo Cínthia, o dono deve estar no dia a dia da empresa. “É preciso estar com o time, conversar com clientes, fornecedores, experienciar as dores do mercado, ajustar o modelo, sempre que necessário. O negócio se reinventa constantemente, mas se o empreendedor não vive o negócio, ele não identificará se as mudanças estão alinhadas positiva ou negativamente ao propósito para tomar decisões assertivas. Sonhe grande e esteja presente na construção desse sonho!”, conclui a especialista.